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The Social Dilemma – Meios & Publicidade
Jorge Faustino, Fullsix Portugal
A estratégia de produção de conteúdos próprios, a qualidade dos mesmos e a “competência” da Netflix na distribuição dos seus conteúdos faz com que, nos últimos tempos, muitos de nós andemos a falar, no âmbito profissional ou pessoal, do documentário The Social Dilemma.
Ao que parece, muitos estão agora a descobrir o conceito do “se não pagas por um produto, tu és produto”. Google, Facebook/Instagram e YouTube são os grandes bichos papões que fazem de nós esse produto…
Vamos por partes.
Relativamente a esta ideia/teoria de que o consumidor é que é o produto, esclarecer que não surgiu com as redes sociais ou com a internet. Esta forma de pensar terá sido pela primeira vez apresentada por dois artistas americanos, Richard Serra e Carlota Fay, em 1973, num vídeo intitulado “Television delivers people”, que criaram para criticar a televisão, o consumo de massas e a pop culture. Foram quase sete minutos de um vídeo muito básico onde, com uma música também ela muito básica, vemos passar frases como: “É o consumidor que está a ser consumido”, “o consumidor é entregue ao anunciante que é cliente”, “vocês são o produto final” ou “vocês são o produto da televisão” (tradução livre).
Curiosamente, ou propositadamente, os artistas escolheram então comprar espaço televisivo para passar este conteúdo de critica ao consumo que estava a ser feito da televisão.
Quase 50 anos depois Richard Serra continua a fazer obras fantásticas (não é para aqui chamado, mas não resisto a tornar pública a admiração que sinto pelas esculturas de ferro deste artista intemporal) e nós continuamos a ser o produto de algo que criámos: antes a televisão, agora as redes sociais. Nós e Tristan Harris, “personagem” principal do The Social Dilemma e co-fundador do Center for Humane Technology (organismo independente que luta para voltar a colocar a tecnologia ao serviço da humanidade e não dela própria) que curiosamente, ou inevitavelmente, se apoia nas redes sociais para divulgar a sua causa.
Estas plataformas, que serviram de mote para o documentário, não deverão sofrer quaisquer consequências em virtude de possíveis alterações de comportamento dos seus utilizadores, ou devo dizer produtos. Numa “sondagem” nada científica que venho fazendo junto de quem viu este documentário tenho confirmado duas coisas: quase todos ficámos chocados com o controlo que estas plataformas têm sobre nós e quase ninguém alterou os seus hábitos de utilização das mesmas. Continuamos a consumir horas de vídeo e a fazer swipe e scroll em todas as direções.
E as marcas? Podem ou devem elas alterar alguma coisa no seu comportamento em virtude do que este comentário pôs mais a nu?
Se quando Richard Serra fez a sua obra audiovisual contestatária, era a televisão que “controlava as pessoas” e era aí que as marcas punham grande parte dos seu foco e esforço para chegar ao consumidor, qual a dúvida de que o digital é hoje a televisão de 1973?
Ninguém parece ter grandes dúvidas disto… falta só alguma coragem para as marcas mudarem o foco.
A digitalização da economia, que a pandemia forçou, não está a ser acompanhada por uma digitalização da comunicação e da “publicidade”. Enquanto marcas fomos todos muito ágeis a adaptarmo-nos ao e-commerce e às suas vantagens. Hoje, todos temos um site de vendas online, mas ninguém quer pagar uma estratégia de e-commerce. Hoje, somos exigentes na contratação de uma agência para nos gerir as redes sociais, mas não queremos investir numa estratégia de conteúdos. Hoje o consumidor faz grande parte da sua journey online e continuamos a dedicar a maior fatia do nosso budget de media à televisão (quem ainda tem budget para isso). Hoje sabemos tudo o que o precisamos de saber para impactar e alterar o comportamento do nosso consumidor, e achamos que por ter uma presença digital as coisas vão acontecer por si… pois não vão. Estar presente não basta. Há que saber estar.
Nota: Refiro-me de forma generalizada às marcas sendo que a carapuça é só para quem servir.
Desabafo: Não passem briefings às vossas agências criativas ou digitais a dizer que querem uma estratégia de conteúdos com “4 posts por semana no Facebook e 3 no Instagram”. Se acham que sabem como desenhar/projectar uma casa, não gastem dinheiro em arquitectos e engenheiros.








